quinta-feira, 9 de março de 2017

Conversa franca sobre Romanos 1

Quando um cristão tradicional quer acusar um cristão membro de uma igreja inclusiva, o repertório é sempre o mesmo: uma pequena lista de textos bíblicos em que atos homogenitais (entre homens, apenas) são condenados: Levítico 18.22; 20.13; 1ª Coríntios 6.9 e 1ª Timóteo 1.10. Com o nascimento de mais uma igreja inclusiva – Comunidade Cidade de Refúgio – liderada pelo casal de pastoras Lanna Holder e Rosânia Rocha, as acusações se multiplicaram. Entretanto, os acusadores cometeram um grave erro ao aplicar tais textos às mulheres, pois nenhum deles faz referência ao sexo entre elas. Nem mesmo Romanos 1.26. Como assim, pastor Alexandre? Paulo foi tão claro!

Bom, a clareza depende de como lemos e interpretamos determinado texto. Uma das regras da Hermenêutica é comparar versículos paralelos – ou seja, que tratem do mesmo assunto – para esclarecer termos obscuros. É aí que os acusadores ficam encurralados! A condenação do sexo entre homens ainda encontra certo número de textos para embasá-la. Mas o que dizer do sexo entre mulheres? Além de Romanos 1.26, nada mais há nas Escrituras que se refira a ele. Se Paulo condena aí a orientação homossexual, comum a homens e mulheres, por que não fez o mesmo em outros textos? Uma coisa, porém deve ficar muito clara: as razões do sexo homogenital masculino condenado na Bíblia não são as mesmas de hoje. Mas esse é um assunto para outro artigo!

É interessante notar como os acusadores esquecem-se por completo do contexto de seus versículos-bala! Ignoram as regras da hermenêutica e da exegese e depois nos acusam de manipular as Escrituras!  Bom, mas vamos ao texto em questão:

26 - Por isso Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza.
27 - E, semelhantemente, também os homens, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, homens com homens, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro.

Para analisar corretamente esse texto, precisamos de dois princípios da hermenêutica e da exegese: o contexto textual e sociocultural.

Quando analisamos o contexto textual, percebemos que os versículos 26 e 27 de Romanos 1 não são independentes, mas têm o seu conteúdo específico iniciado a partir do versículo 18: a impiedade dos homens e a supremacia de Deus em relação à Criação. A idolatria é um dos temas centrais, o que fica evidente entre os versículos 23 a 25 (Pois mudaram a verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é bendito eternamente. Amém). O Versículo 26 inicia-se com a expressão por isso, ou seja, explica porque aqueles atos antinaturais foram cometidos.

A idólatra Roma servia a muitos deuses, bem como cultuava o hedonismo - o prazer como bem supremo. Paulo faz uma análise das consequências dessa realidade tão abominável diante de Deus. Uma das práticas comuns aos cultos romanos era a prostituição cultual. Ali, homens heterossexuais se envolviam em rituais homossexuais, o que justifica a expressão: deixaram a relação natural com a mulher. Ou seja, homens heterossexuais, trocaram uma conduta sexual que lhes era natural por outra, contrária à sua natureza, ou seja, uma prática homossexual, simplesmente como fonte de prazer e de expressão ritualística.

Quanto ao sexo entre mulheres, o texto de Paulo não é definitivo em afirmá-lo, havendo, inclusive, quem acredite que o Apóstolo mencionava o sexo anal heterossexual. Essa interpretação perdurou durante toda a Idade Média. Tudo indica, porém, que o texto esteja fazendo referência a duas cerimônias comuns entre os romanos daquela época: o culto a Bona Dea – restrito às mulheres, inclusive com a prática de cópula com animais; e o culto a Baco, ou bacanais, em que o incesto era parte dos ritos de iniciação. Todas essas práticas eram contrárias à natureza segundo o pensamento judaico, para o qual a função principal do sexo era a procriação.

O texto faz menção a relações contrárias à natureza praticadas em um contexto bastante específico: a adoração de ídolos. Nenhuma ideia há que reflita as relações homoafetivas e monogâmicas da sociedade atual.

O texto fala de homens e mulheres que praticaram perversões sexuais específicas, contrárias a sua natureza. Homens de orientação homossexual nunca deixaram a relação natural com a mulher (v.27), simplesmente porque isso nunca lhes foi natural! O sexo entre mulheres não está em questão visto que a penetração e a semente (exclusiva dos machos, segundo a visão da época) eram necessárias para que um ato fosse considerado de natureza sexual.

Alguns leitores podem estar pensando: “que nada, essa interpretação é forçada! Vocês estão deturpando a Bíblia para ajustá-la às suas práticas homossexuais!” Bom, para provar que essa análise não é invenção de teólogos gays, vamos ver o que diz o comentário da Bíblia de Estudo Dake, CPAD, sobre esse texto:

“... Esse tipo de idolatria tem sido a raiz de toda imoralidade abominável dos pagãos. Os ídolos têm sido os padroeiros da licenciosidade (vv. 23-32). Quando davam forma humana a seus deuses, eles os dotavam de paixões e desejos e os representavam como escravos de infames perversões sexuais e como possuidores de poderes ilimitados de satisfação sexual. Deus permitiu que eles se entregassem a pecados homossexuais e perversões desse tipo.

Entretanto, não faltam tentativas de alterar o que Paulo escreveu. Vejam como a Nova Bíblia Viva, Editora Mundo Cristão, Edição 2011, traduziu Romanos 1.26:

“Esta é a razão pela qual Deus os entregou a paixões pecaminosas, a tal ponto que até suas mulheres se voltaram contra o plano natural que Deus tinha para elas e cederam aos pecados sexuais entre elas mesmas.”

Bom, diante de tudo o que expusemos, deixo uma pergunta aos nossos acusadores: Quem está deturpando a Bíblia para ajustá-la às suas crenças?

Fonte: www.teologiaeinclusao.blogspot.com.br
Autor:  pastor Alexandre Feitosa

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